terça-feira, 4 de setembro de 2007

Praga


Ponto de junção e intersecção e divergência de histórias, nações e povos. Coração no coração da Europa. Início do fim do Ocidente, a quem almejas voltar mas a quem não consegues evitar o olhar frio, distante e desconfiado, fruto dos teus humores, do feitio das tuas gentes e da tua história. Praga Dourada, é um prazer descobrir-te e percorrer os teus labirintos monumentais, em que cada casa, cada rua é uma ambígua obra de arte barroca a eternizar os Habsburgs mas também a tua herança eslava. Cristã e judia, ocidental e oriental, germânica e eslava, reminiscências socialistas e orgulho de integração rápida na EU, ambígua por excelência, dificilmente uma outra qualquer cidade do continente poderia haver parido um Kafka. Em cada rua vejo-lhe uma linha de texto, e em cada linha de texto de Kafka vejo-te, Praga. Vejo-te na beleza da ponte Carlos sobre o teu Vltava. Vejo-te na tua força cabalística esotérica, nos teus ghettos hebraicos medievais, no teu Golem protector.
Vejo-te no teu Castelo, jóia mais preciosa e querida do teu tesouro infindável, manchada de sangue pelo episódio da defenestração.
Vejo-te no teu âmbar.
Vejo-te no teu absinto verde e nas tuas Pilzners douradas.
Vejo-te nos lindos olhos azuis das tuas filhas.
Vejo-te nos teus cristais da Boémia, nos teus ovos decorativos e matrioskas, nos teu Menino Jesus de Praga de porcelana, no relógio da torre com procissão de figuras animadas de santos e a bênção especial do teu São Venceslau nas horas ímpares, no relógio duplo da torre da tua sinagoga velha.
És bela. Mas sinto-me oprimido pelo calor seco do teu Verão e tento imaginar como ainda deves ser mais espantosamente bela de Inverno, com toda a tua majestade alva de neve.

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